E os bobos a tudo assistem sem entender nada

Entre as muitas frases do deputado Ulysses Guimarães, presidente do MDB e da Assembleia Nacional Constituinte de 1988, pelo menos uma ajuda a explicar por que o Congresso decidiu manter por 398 votos contra 2 o principal veto do presidente Jair Bolsonaro ao projeto que criou o Orçamento Impositivo da União:
“A única coisa que mete medo em político é o povo na rua”.
Foi com medo das manifestações previstas para o próximo dia 15, convocadas por movimentos conservadores alinhados com o governo, que a Câmara dos Deputados abriu mão de parte dos R$ 30 bilhões que reservara no Orçamento para pagamento futuro de emendas parlamentares. Ponto a favor de Bolsonaro.
Ponto contra: empenhado em abrandar a ira dos seus devotos que se opõem a qualquer tipo de entendimento entre o governo e o Congresso que culpam pelos males que afligem o país, Bolsonaro havia garantido nas redes sociais que não negociaria o uso dos R$ 30 bilhões. Pois negociou. E ficou com o pedaço menor.
O relator do Orçamento, deputado Domingos Neto (PSD-CE), terá o poder de destinar R$ 19 bilhões em emendas ao Orçamento Impositivo. Em contrapartida, os recursos poderão ser contingenciados pelo governo e não haverá controle de deputados e senadores sobre a ordem de execução das emendas individuais.
Bolsonaro finge que não dá o que o Congresso lhe cobra. E o Congresso finge que não recebe. É tudo um jogo de cena. Nem Dilma para não cair, nem Temer para não ser denunciado por corrupção liberaram tanto dinheiro para o pagamento de emendas parlamentares ao Orçamento como fez Bolsonaro até aqui.
Ao Congresso não interessa que se saiba disso porque causaria mais danos à sua imagem. Pela mesma razão, também não interessa a Bolsonaro, que se elegeu prometendo acabar com o toma-lá-dá-cá entre o governo e o Congresso. Acabou nada. A tal da Nova Política é uma versão recauchutada da Velha Política.
O Congresso torce agora para que o acordo em torno do Orçamento diminua a fúria com que será tratado pelos bolsonaristas nas ruas. Bolsonaro torce para que os manifestantes se limitem a criticar o Congresso, deixando em paz a Justiça. Não pode dar-se ao luxo de brigar com dois Poderes ao mesmo tempo.